Dizia-se que o pentecostalismo era apenas um movimento em busca de uma teologia. No entanto, suas raízes sempre estiveram profundamente cravadas na interpretação fiel da Bíblia e nas doutrinas cristãs ortodoxas. Pesquisas sérias sobre sua história revelam uma tradição teológica sólida e bem construída.
Embora compartilhe diversas crenças com outras denominações evangélicas, o pentecostalismo se distingue pelo testemunho vivo da obra do Espírito Santo no meio da Igreja — um diferencial pulsante e visível.
Desde os primeiros séculos do cristianismo, sempre houve aqueles que ansiavam por algo mais em sua jornada espiritual. E a pergunta sobre o batismo no Espírito Santo e os dons espirituais nunca saiu de cena. De acordo com Killian e George T. Montague, em Christian Initiation and Baptism in the Holy Spirit, o batismo no Espírito era parte essencial da iniciação cristã durante os oito primeiros séculos da Igreja.
Com o surgimento do reavivalismo no final do século XVII e início do XVIII, na Europa e na América do Norte, pregadores calvinistas, luteranos e arminianos passaram a destacar o arrependimento e a piedade como marcas da vida cristã. Entender o pentecostalismo exige mergulhar nesse contexto, especialmente na doutrina da perfeição cristã ensinada por João Wesley.
Em uma de suas publicações, o pai do metodismo argumenta sobre uma "segunda obra da graça" e chama seus seguidores a buscarem uma nova dimensão espiritual. Essa segunda obra, posterior à conversão, visava libertar os crentes da natureza moral imperfeita. Essa doutrina cruzou o Atlântico e impulsionou o Movimento da Santidade na América do Norte — ainda sem menção ao falar em outras línguas.
Aos que buscavam a chamada “segunda bênção”, era ensinado que deveriam “esperar” pela promessa do batismo no Espírito Santo, como registrado em Lucas 24.49:
"E eis que sobre vós envio a promessa de meu Pai; ficai, porém, na cidade de Jerusalém, até que do alto sejais revestidos de poder."
A crença na segunda obra da graça também não ficou restrita ao metodismo. Charles Finney defendia que o batismo no Espírito revestia o crente de poder para alcançar a perfeição cristã. Dwight L. Moody, teólogo reformado, também via o batismo como uma segunda bênção, ainda que a santificação continuasse um processo progressivo. Já A. B. Simpson, ex-presbiteriano, enfatizava nitidamente o batismo no Espírito, influenciando diretamente a formação doutrinária das Assembleias de Deus.
Naquele tempo, a medicina avançava a passos lentos. Sem muitas alternativas para os doentes, muitos passaram a abraçar a fé no poder miraculoso de Deus para a cura física. A Teologia da Santidade, com sua crença no revestimento do Espírito, preparou terreno para a doutrina da cura divina imediata pela fé. Para muitos, o batismo no Espírito restaurava o relacionamento espiritual perdido no Éden.
Os defensores da cura se apoiavam especialmente em Isaías 53.4-5, que afirma:
"Verdadeiramente, ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores levou sobre si (...); e, pelas suas pisaduras, fomos sarados."
E também nas promessas do Novo Testamento.
À medida que o Movimento da Santidade ganhava contornos mais “pentecostais”, seus adeptos se mostravam abertos aos dons do Espírito — ainda que, inicialmente, sem destaque para o falar em línguas.
Em 1895, Benjamin Hardin Irwin, pregador radical do Movimento da Santidade, propôs que não havia apenas duas, mas três obras da graça: a segunda iniciava a santificação, e a terceira trazia o batismo no Espírito Santo. Embora o Movimento da Santidade tenha rejeitado essa ideia como heresia, a noção de uma terceira obra (o revestimento de poder) se firmou como um dos alicerces do pentecostalismo, ao qual Irwin viria a se unir.
Na mesma época, W.B. Godbey, líder do Movimento da Santidade, afirmava que o dom de línguas seria crucial para a evangelização dos povos não alcançados nos últimos dias. Assim, a obra missionária foi integrada ao Movimento Pentecostal: todos os missionários eram incentivados a buscar esse dom para pregar fluentemente nos idiomas locais.
Até então, Santidade e Pentecostalismo caminhavam lado a lado. Mas, na virada do século, o Movimento da Santidade começou a se distanciar das reformas pentecostais na doutrina wesleyana. O pentecostalismo, por sua vez, priorizou o dom de línguas como evidência teológica clara.
Entre os que buscavam o poder do Espírito para evangelizar o mundo estava Charles Fox Parham, do Kansas. Influenciado por Irwin e Sandford, Parham testemunhou um poderoso reavivamento em uma escola bíblica em Topeka, onde alunos falaram em novas línguas após receberem o batismo no Espírito Santo.
A contribuição teológica mais marcante de Parham foi a defesa de que o falar em línguas é a evidência bíblica vital da terceira obra da graça: o batismo no Espírito.
Esse movimento em Topeka pavimentou o caminho para o famoso Avivamento da Rua Azusa, em Los Angeles (1906-1909), liderado por William J. Seymour. Afro-americano, Seymour foi símbolo de reconciliação racial e de derramamento do Espírito entre os marginalizados.
Se quisermos resumir os pilares do pentecostalismo, poderíamos dizer:
Parham deixou o legado da escatologia e do evangelismo mundial, enquanto Seymour marcou profundamente a reconciliação e a comunhão dos povos.
Durante seus primeiros 16 anos, o Movimento Pentecostal enfrentou três grandes controvérsias teológicas:
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A primeira, em 1906, debatia se os relatos de Atos e Marcos 16 validavam teologicamente o falar em línguas como evidência inicial do batismo. A partir daí, cresceu o entendimento de que, em geral, o falar em línguas representava a oração no Espírito — uma glossolalia, e não necessariamente idiomas humanos (xenolalia).
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A segunda polêmica girava em torno da santificação: seria um ato instantâneo ou um processo progressivo? Aqui, pentecostais wesleyanos e reformados se dividiram.
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A terceira controvérsia envolveu a ênfase em uma "unicidade" da Divindade, rejeitando o conceito ortodoxo da Trindade. Para os fundadores das Assembleias de Deus, essa unicidade era uma falsa doutrina, e a fé apostólica verdadeira precisava ser preservada.
Quando, em 1914, aconteceu o primeiro concílio geral das Assembleias de Deus, já havia um consenso doutrinário fundamentado na fé histórica — mas não foi criado um novo credo ou rompidos os alicerces tradicionais.
Assim nasceu a maior potência pentecostal do mundo: a Assembleia de Deus, formada para proclamar o Evangelho entre as nações, discipulando novos cristãos com a gloriosa ajuda do Espírito Santo.